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Foto do escritorBruno Vieira

Reis e Ribeiro: o domínio político e o continuísmo das famílias tradicionais à frente do poder municipal de Lagarto

Atualizado: 23 de mai.

Fotos: SERESE

No Brasil a política é traçada por diversas dinâmicas inerentes ao nosso processo de formação social. Neste sentido, a política perpetrada na escala municipal é, seguramente, a que melhor traduz a natureza dos fenômenos (do coronelismo, do mandonismo e do patrimonialismo) constituidores do formato político que ainda perdura. Ou seja, a política do domínio e do “continuísmo” de famílias tracionais à frente do poder executivo municipal por gerações.  


Ao se fazer uma rápida correlação de quem são, atualmente, os sujeitos que compõem o quadro político brasileiro nacional, não é difícil notar que são filhos, netos e bisnetos de antigos donos de engenhos, coronéis, fazendeiros, latifundiários. Esta realidade tem sua gene no recorte socioespacial do município. Isso significa que, as famílias tradicionais exercem há gerações forte influência na política local, controlando “currais eleitorais”, partidos e grupos políticos, meios de produção e de comunicação (especialmente as rádios). São dispositivos indispensáveis à manutenção das suas bases político-econômica e, com isso, a continuidade dos seus membros à frente da gestão do aparato público municipal. Além disso, essas famílias tradicionais se valem destes privilégios para dar sustentação a novos projetos políticos da parentada, como, por exemplo, projetar os nomes dos seus integrantes nos âmbitos da política estadual e nacional. 


Neste dinamismo pode existir a hegemonia de uma única família tradicional, ou a disputa entre duas (ou mais) famílias tradicionais pelo domínio da política local. Desta forma, existindo uma disputa particular e uma alternância seletiva na gestão pública municipal, por membros de ordenamentos familiares clássicos. Realidade que observamos de modo explícito nos municípios sergipanos; como é o caso das influentes famílias tracionais de Lagarto: a família Ribeiro e a família Reis. 

Prefeitura de Lagarto, década de 1950.

O grupo conhecido como “Bole-Bole”, rivaliza o domínio político municipal com os membros da família Reis, grupo conhecido por “Saramandaia”. A família Ribeiro mantém-se dentro dos quadros da política sergipana, ininterruptamente, há décadas.  O patriarca dos Ribeiros, Rosendo Ribeiro de Souza, era fazendeiro, com atividades voltadas à pecuária, foi filiado à UDN, tinha grande influência sobre as decisões políticas de Lagarto nos anos de 1950. Seus filhos, Rosendo Ribeiro Filho (Ribeirinho) e José Raimundo Ribeiro (Cabo Zé) foram os primeiros a ingressar diretamente na política, isso em 1962. A família Ribeiro é dona de uma das principais rádios do interior do estado, a Eldorado FM. Ribeirinho é considerado, até os dias atuais, o principal nome da sua família, sendo os seus descendentes (filhos e netos), os membros que mais se sobressaíram na seara política.

Família Ribeiro.

Os nomes dos membros da Família Ribeiro que, nas últimas seis décadas aturam e os que na atualidade seguem  na política são os seguintes: Rosendo Ribeiro Filho (foi vereador, prefeito e deputado estadual por 5x); José Raimundo Ribeiro (irmão de Ribeirinho, foi deputado estadual por 2x e prefeito de Lagarto); Adelson Ribeiro (filho de Cabo Zé, foi deputado federal); Luiza Ribeiro (filha de Ribeirinho, foi deputada estadual); Acácia Ribeiro (filha de Ribeirinho, foi vereadora de Lagarto); Júnior Ribeiro (filho de Cabo Zé, foi vice-prefeito de Lagarto); Gustinho Ribeiro (neto de Ribeirinho, foi vereador de Lagarto, deputado estadual e, atualmente, é deputado federal pelo segundo mandato); Hilda Ribeiro (esposa de Gustinho Ribeiro, foi vice-prefeita e, atualmente, é prefeita de Lagarto); Aurea Ribeiro (nora de Ribeirinho, mãe de Gustinho Ribeiro e sogra de Hilda Ribeiro, é deputada estadual).


No que tange à família Reis, o nome de maior expressão é o de Arthur de Oliveira Reis, vulgo “O Gavião” (1926-2021). O chefe político lagartense fundou e comandou por décadas o tradicional grupo político da família Reis, popularmente conhecido por “Saramandaia”. Arthur Reis, além de político influente, era um importante empresário, atuando em diversos segmentos do setor econômico (agricultura, pecuária, comércio e comunicação, mais especificamente do rádio). Durante o período em que atuou dentro do campo político, foi deputado estadual por 3 mandatos, e prefeito de Lagarto entre 1982 a 1988. Jerônimo de Oliveira Reis (herdeiro do comando do grupo “Saramandaia”), primogênito de Arthur, seguindo os passos do pai, acessou à esfera política em 1986, candidatando-se a deputado estadual pelo PFL.

Fábio e Sérgio Reis entre o governador Fábio Mitidieri e a secretárias Danielle Garcia.

A família Reis estabeleceu sociedade importantes com destacados empresários lagartenses, principalmente com José Augusto Vieira, dono do grupo Maratá, e com José Rodrigues do Santos, o Zezé Rocha, dono do grupo Rocha. Da sociedade com Zezé Rocha, tornaram-se um dos titulares da concessão da rádio Aparecida FM, aparelho ideológico do grupo “Saramandaia”, concorrente da rádio Eldorado FM, aparelho ideológico do grupo “Bole-Bole”, sendo que durante os períodos eletivos, principalmente, convertem-se em palanques de ataques políticos mútuos dos grupos.


Os nomes dos membros da Família Reis que, nas últimas seis décadas aturam e os que na atualidade seguem  na política são os seguintes: Arthur de Oliveira Reis (patriarca da família, foi deputado estadual por 3x e prefeito de Lagarto); Jerônimo de Oliveira Reis (filho de Arthur Reis, foi deputado estadual, deputado federal por 3x, vice-prefeito, prefeito de Lagarto por 2x); Sérgio de Almeida Reis (filho de Jerônimo Reis, foi deputado federal); Goretti de Oliveira Reis (filha de Arthur Reis, foi deputado estadual por três mandatos); Fábio de Almeida Reis (filho de Jerônimo Reis, está atualmente no 3º mandato de deputado federal).


Antes mesmos dos seus respectivos grupos serem caricatamente apelidados de “Bole-Bole” e “Saramandaia”, as duas famílias tradicionais já se confrontavam pelo domínio da política local, tendo como marco temporal a eleição de 1962, quando Ribeirinho foi eleito prefeito de Lagarto.   Fortuitamente, quando não estão diretamente concorrendo ao cargo do executivo municipal, ou seja, com os seus próprios membros na disputa, estão apoiando outras figuras políticas locais: correligionários, aliados e amigos, principalmente integrantes de ramificações familiares congêneres de menor cabedal político; a exemplo das conjunturas em que Zezé Rocha (1989-1992 e 2002-2009, pelo PFL e PTB) e Lila Fraga (2013-2017, pelo PSDB), esteve no poder apoiados pelos Reis, ou quando o ex-deputado estadual, Valmir Monteiro, ocupou a cadeira de prefeito (2009-2013 e 2017-2019, pelo PSC), apoiado pelos Ribeiros.

Prefeitura de Lagarto.

O entendimento é de que a polarização entre os principais grupos políticos tradicionais, historicamente, impossibilita a ascensão de outras figuras políticas que, desprovidas da musculatura político-econômico que os Reis e os Ribeiros usufruem há décadas, não chegam a alcançar projeções significativas nas eleições municipais, obtendo números muito desproporcionais daqueles obtidos pelos membros ou representantes das duas famílias tradicionais. Certifica-se deste modo, a lógica da política passada de pai para filho, do filho para o neto, e assim, por gerações.  O feito de uma pessoa de fora deste círculo, eleger-se sem o esteio das famílias Reis e Ribeiro, apresenta-se como algo quimérico à população de Lagarto, algo não testemunhado há décadas. Nas eleições deste ano, nada diferente do que já se naturalizou, pela família Reis, o pré-candidato é Sérgio Reis (PSD), filho do ex-prefeito Jerônimo Reis e irmão do deputado federal Fábio Reis (PSD), e pela Família Ribeiro, a postulante situacionista, Rafaela Ribeiro, sobrinha do deputado federal Gustinho Ribeiro (REPUBLICANOS), e neta da deputada estadual, Áurea Ribeiro (REPUBLICANOS), candidata (pré)lançada pela atual prefeita, Hilda Ribeiro (SD), como sua possível sucessora.   


Fazer oposição a estas duas famílias vindo do nada, sem poder econômico e tradição política, é um grande desafio, fato que desencoraja outras candidaturas. O que significa que, atuar no campo do dissenso contra a nata da política municipal lagartense, isto é, contra aqueles que controlam (além de outros segmentos socioeconômicos) o aparelho público que detém boa parte dos empregos do município, aparenta-se como um trabalho de oposição inglório.

Perante o exposto, dada a hegemonia, o domínio e a influência político-econômica de famílias tradicionais, chama-se atenção para a supressão da pluralidade de atuação e de representação de outras famílias, grupos, classes, segmentos e atores sociais que ficam à mercê do modelo de representação político-partidária arcaico, arbitrário e excludente.


Portanto, o “continuísmo” de famílias tradicionais no poder municipal é um fenômeno multifacetado, sustentado por uma combinação de fatores históricos, econômicos, sociais e culturais. Entender essas dinâmicas é crucial para a análise política e para a formulação de estratégias que promovam a democratização, renovação e pluralização da política local, estadual e nacional, ou seja, em sua totalidade.


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