Estamos acostumados a ouvir falar de uns tais de “ Ilustres Sergipanos “, todos eles, homens, brancos, heterossexuais. Estes estão estampados por toda a cidade, seja em nomes de praças ou de ruas e até mesmo de instituições. Temos o mal costume de heroicizar todos estes homens ao passo que esquecemos de importantes mulheres que compõem a demografia sergipana, é o caso de Mãe Marizete. Mulher, Preta, Candomblecista e símbolo de resistência. Não podemos deixar de conferir a ela também esse título de Ilustre Sergipana, ainda em vida. Sua atuação e presença perpassam gerações e merece o devido respeito e reconhecimento.
Marizete Silva Lessa, mais conhecida como Mãe Marizete, nasceu na cidade de Laranjeiras, região do Vale do Cotinguiba, cidade localizada a 19 km da capital sergipana. Com seus mais de 90 anos de idade, é hoje a candomblecista mais antiga do estado de Sergipe. Foi para o candomblé ainda criança, influenciada por sua Tia-Mãe Erundina Nobre Santos, mais conhecida por Nanã, a qual a criou e ajudou a se tornar a mulher que ela é hoje.
Iniciada aos 10 anos de idade no candomblé, Mãe Marizete colheu e ainda colhe os frutos de sua fé e religiosidade, sejam eles bons ou ruins. Em entrevista para minha página no instagram, @oabiudo, ela conta que desde pequena sofreu com o preconceito e a intolerância religiosa e relata um caso lamentável ocorrido já aqui na cidade de Aracaju, onde mora desde criança.
Ela relata o seguinte: Um grupo de estudantes pegaram um bode, o vestiram com terno e gravata junto com farofa e jogaram na porta do palácio do governo. Esse fato é narrado com bastante tristeza por Mãe Marizete, pois foi o que levou o candomblé em Sergipe sofrer fortes repressões por parte do poder público.
O caso foi narrado também para Florival José de Souza Filho, pesquisador formado pela Universidade Federal de Sergipe e está presente em sua dissertação de Mestrado em Sociologia intitulada “Candomblé na cidade de Aracaju: Território, Espaço Urbano e Poder Público”.
Retomando à entrevista, Mãe Marizete relembra que toda sua infância foi dentro do Candomblé junto com sua mãe, a Mãe Nanã. Apesar dos percalços sofridos de intolerância religiosa, hoje, Mãe Marizete é muito respeitada dentro da sociedade sergipana como símbolo do candomblé no estado, ganhando diversos prêmios que a põe nesse local de prestígio, não somente dentro da sociedade aracajuana, mas também de Sergipe como um todo.
O terreiro dessa importante Mãe de Santo está localizado na Zona Oeste de Aracaju, no Bairro América, próximo ao Santuário São Judas Tadeu dos Frades Capuchinhos. O Abassá São Jorge realiza uma importante função social de acolhimento aos membros do candomblé, mas também de diversas pessoas que procuram o terreiro para serem atendidos por Mãe Marizete. O mês de dezembro é o que mais tem movimentações devido às celebrações das Orixás Iansã e Oxum, nos dias 4 e 8 de dezembro respectivamente.
Mãe Marizete faz ecoar a voz do candomblé em Sergipe pela sua história de luta e resistência, ela é símbolo de afro-sergipanidade e devemos ter orgulho dessa Ilustre Sergipana que com suor, garra, fé e punho forte mantém viva a tradição do culto afro no estado.
Nós enquanto cidadãos sergipanos devemos reconhecer a importância do candomblé em Sergipe e lutar contra qualquer tipo de intolerância religiosa, pois isso se constitui como crime para a lei, como está previsto na Constituição de 1988 e no Código Penal Brasileiro, em seus artigos 5º e 208º respectivamente.
Para os intolerantes, a força da lei!
Um salve a todo o povo de Santo em Sergipe.
[*] Estudante de História da Universidade Federal de Sergipe (UFS), membro do Grupo de Estudos e Pesquisas de História da África e da Diáspora Africana (GEPHADA) e criador do projeto @oabiudo no instagram.