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Foto do escritorAndré Carvalho

Há um abismo entre os jovens e a política - e é injusto cobrá-los pela distância

Atualizado: 15 de fev. de 2023


Em ano de eleições acirradas, o baixíssimo número de jovens de 16 e 17 anos aptos a votar assusta quem acompanha o tema - é o menor percentual da história. Partidos e políticos se manifestam ressaltando a importância desse grupo nas eleições, mas o fato é que o desinteresse do jovem na política é uma resposta ao desinteresse da política pelos jovens.

Trago alguns números: PT, MDB, União Brasil, PP e PDT eram, em fevereiro deste ano, os maiores partidos em número de filiados no Estado, em ordem de grandeza. O PT com 15.625 e o PDT com 10.289.

O número de jovens filiados de 16 até 24 anos são: PT, 110; MDB, 120; União Brasil, 78; PP, 214; PDT, 107. O percentual desse grupo no quadro desses 5 partidos é 0,98% enquanto que o mesmo grupo representava 14,7% do eleitorado apto a votar em Sergipe em fevereiro deste ano.

Não é totalmente verdade se afirmar que a política não tem interesse pelo jovem. Ela tem, mas nos que nascem em berço político ou que possuem recursos econômicos significativos. Já os que possuem apenas vontade, dificilmente obtêm dos partidos e dos políticos apoio substancial.

Li recentemente uma fala da senadora Maria do Carmo, União Brasil, na qual ela valoriza a participação da juventude, mas ao mesmo tempo não vi ao seu redor nenhum movimento de dar suporte para o surgimento de novas lideranças senão de sua família. Esse movimento de tratar política como espaço hereditário pode ser visto no empenho em eleger sua filha.

Também recentemente, vi mais duas Déda se filiarem a partidos de agrupamentos distintos, uma mais jovem e outra mais madura. A filiação de ambas repercutiu muito mais por seus laços familiares com o maior político sergipano do que por suas qualidades individuais.

Essa perpetuação política por sobrenome era algo criticado por Marcelo e que agora é reproduzido. Tenho consciência da enorme contribuição que ambas darão, assim como Eliane Aquino, PT, tem feito no sentido de defender seus próprios ideais que aprendidos possivelmente com Marcelo, mas que se modificam nas suas vivências e na dinâmica da vida.

Escolhi chamar Marcelo Déda por Marcelo justamente para evidenciar que ele era um indivíduo único, plantou sua semente em muitos outros indivíduos que possuem ou não seu sangue e que com suas histórias transformam o que aprenderam em algo novo.

Ressalto que não é uma crítica aos personagens, mas ao sistema que sempre prioriza quem é familiar em detrimento daqueles que surgem e que são apoiados por si e que necessitam de suporte dos partidos. Sem espaço no PT, talvez Marcelo não fosse reconhecido inconfundivelmente como Déda, apesar de muitos Déda o antecederam e outros muitos o sucederem.

Mobilizar a juventude, oferecer formação política de qualidade e condições de levantar debates dentro da estrutura partidária, requer muita força de vontade, tempo e recursos do fundo partidário. É mais cômodo esperar que essas pessoas se façam por si e, com o quadro pronto, o integre ao partido.

Alguns partidos se empenham mais em dar condições para sua militância mobilizar e formar novos atores políticos, geralmente os de esquerda e que possuem ligação histórica com uma política de construção popular. Mesmo esses, quando é a hora de dar espaço e condições reais, o filho do deputado receberá maior atenção e recursos de campanha do que a professora militante histórica.

A política teima em se fechar para a participação popular. Quantos diretórios partidários são conhecidos pela população, frequentados por seus militantes ou são pontos de debate? Quantos partidos valorizam sistematicamente a participação dos jovens em sua pluralidade de vivências? Quantos políticos realmente se preocupam em formar novas lideranças e não apenas em sugá-las?

A palavra autocrítica, que virou vírgula para alguns comentaristas políticos, deve ser realmente feita por políticos e partidos, principalmente para os de centro e centro-direita que não possuem tradição em mobilizar a população além do preenchimento de uma ficha, mas também para os de esquerda que parecem querer imitar esse padrão.


*Originalmente publicado no portal JL política.

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